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Endometriose: o que é e como se trata?

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Miguel RaimundoMiguel Raimundo, Médico Especialista em Ginecologia e Obstetrícia e Medicina da Reprodução


A endometriose é uma doença ginecológica caracterizada por tecido semelhante ao endométrio fora do útero e está associada a dor e infertilidade. O tecido ectópico endometrial está geralmente localizado na pélvis, mas pode aparecer em qualquer parte do corpo. Os locais mais comuns são os ovários, o fundo-de-saco de douglas, o ligamento útero-sacral e largo, as trompas de Falópio, o cólon sigmoide e o apêndice. Como dependem de estrogénio, as lesões ectópicas sofrem ciclos de crescimento e hemorragia em sincronia com o ciclo menstrual. A doença exibe um amplo espectro de sinais clínicos e sintomas, propensos a progressão e recorrência. Além disso, a endometriose afeta a qualidade de vida de forma significativa.

Como, atualmente, não existe um método não invasivo e confiável para diagnosticar a endometriose, a verdadeira prevalência não é conhecida. A cirurgia é considerada o método definitivo para o diagnóstico, mas, geralmente, não é realizada em mulheres sem sintomas ou achados físicos que sugiram fortemente a doença. Consequentemente, as estimativas podem variar com a indicação para tratamento cirúrgico. A idade média no momento do diagnóstico da endometriose varia entre os 25 e os 35 anos.

Entre os fatores de risco estão a nuliparidade, a menarca precoce, a menopausa tardia, os ciclos menstruais curtos, o período menstrual longo, as anomalias müllerianas, as raças caucasiana e asiática, o histórico familiar, o baixo índice de massa corporal, o consumo de álcool e cafeína, entre outros.

No entanto, também existem fatores que diminuem o risco, tais como a multiparidade, os intervalos extensos de amamentação, a menarca tardia (> 14 anos), a raça negra, o tabagismo e o exercício físico regular.


Diagnóstico de Endometriose

O diagnóstico de endometriose requer visualização cirúrgica das lesões e evidência histológica de glândulas endometriais ectópicas e estroma. Apesar de ser um problema comum, permanece difícil de diagnosticar. Infelizmente, ainda não existe uma alternativa à laparoscopia para o diagnóstico da doença que seja não invasiva e confiável. No entanto, para detetar endometriose, pode fazer-se um exame físico, um teste de diagnóstico não invasivo CA-125, uma ecografia endovaginal ou transretal, ou uma ressonância magnética.


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A que se associa a dor?

A dor é um dos sintomas mais comuns associados à endometriose, sendo os mecanismos envolvidos difíceis de determinar, por várias razões. Na endometriose, a dor pélvica é mais frequentemente crónica e associada a dismenorreia entre 50 e 90% dos casos; dispareunia, dor pélvica profunda e dor abdominal inferior (com ou sem dor nas costas / virilha) também são comuns. A dor, geralmente, piora com o tempo e pode mudar de padrão. Quando os sintomas da bexiga e do intestino estão presentes são, geralmente, cíclicos.

A dor associada à endometriose foi atribuída a três principais mecanismos:

  • Efeitos diretos e indiretos da hemorragia focal de implantes endometrióticos;
  • Ações das citocinas inflamatórias na cavidade peritoneal;
  • Irritação ou infiltração direta de terminações nervosas pélvicas.

Muitas mulheres com endometriose avançada têm pouca ou nenhuma dor enquanto aquelas com doença leve podem apresentar dor incapacitante.


A Endometriose e a Infertilidade

A endometriose está fortemente associada à infertilidade. A prevalência de endometriose aumenta dramaticamente para até 50% em mulheres com infertilidade, sendo que entre 30 e 50% das mulheres com endometriose são inférteis.

Numerosas observações podem apoiar uma relação entre endometriose e infertilidade:

  • A prevalência geral de endometriose é maior em mulheres inférteis do que em férteis;
  • Mulheres inférteis são mais propensas a ter doença moderada a grave do que mulheres férteis;
  • A prevalência de endometriose mínima em mulheres inférteis com parceiros azoóspermicos é comparável.

A taxa de gravidez em mulheres com endometriose leve, submetidas a tratamento com estimulação exógena com gonadotrofina e inseminação intrauterina é menor quando comparada com mulheres sem doença. O sucesso da fertilização in vitro está correlacionado negativamente com a gravidade da endometriose.


A infertilidade associada à endometriose tem sido atribuída a vários mecanismos, incluindo anatomia distorcida e inflamação e expressão genética do endométrio anómalo.


Tratamento da Endometriose

A endometriose deve ser considerada uma doença crónica que requer tratamento a longo prazo com o objetivo de maximizar o uso de terapêutica médica e evitar cirurgias repetidas. Os objetivos da terapêutica passam por diminuir as complicações (dor e infertilidade), mais do que eliminar lesões.

O tratamento de endometriose inclui: terapêutica expectante, analgesia e terapêutica hormonal, analgésicos contracetivos orais combinados cíclicos, contínuos ou tricíclicos, agonistas da GnRH, progestativos orais, parentéricos ou intra-uterinos, danazol, inibidores da aromatase e terapêutica cirúrgica (conservadora, definitiva) ou combinação de terapêutica médica (antes ou depois) com cirúrgica.

O tratamento médico baseia-se na premissa de que o endométrio ectópico responde da mesma forma que o endométrio eutópico, portanto, os objetivos têm sido reduzir ou eliminar a menstruação, diminuindo assim a probabilidade de desenvolvimento de novos implantes e suprimir o crescimento e atividade do endométrio, antecipando que o mesmo ocorra nos implantes de endometriose. Não existe evidência de que uma terapêutica médica seja superior a outra no tratamento da dor.

O tratamento cirúrgico tem como objetivo reestabelecer a anatomia normal, excisar ou destruir qualquer doença visível, e prevenir ou atrasar a recorrência da doença. Pode ser terapêutica de 1ª linha nas mulheres que pretendem engravidar e têm endometriose moderada a grave que distorce a anatomia pélvica.

Não existe evidência de qualquer tipo de terapêutica médica ou cirúrgica que afete a fertilidade futura. O tratamento deve ser individualizado tendo em conta a gravidade dos sintomas, a extensão e localização da doença, a existência de desejo de gravidez, a idade, os efeitos adversos e a taxa de complicações cirúrgicas.


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Tratamento de Endometriose associada a Infertilidade

Existem várias opções de tratamento disponíveis para mulheres com endometriose que pretendem engravidar. Embora não seja recomendado rotineiramente, o tratamento expectante é uma opção para mulheres com receio na estimulação ovárica, com ou sem inseminação intrauterina (IIU) ou fertilização in vitro (FIV).

A taxa de fecundidade em mulheres com endometriose é menor do que na população reprodutiva não infértil. Como a probabilidade geral de sucesso com terapêutica expectante é menor, deve ser considerado apenas em mulheres que não têm doença em estádio avançado e que tenham menos de 35 anos de idade.

Os efeitos da cirurgia na fertilidade em mulheres com dor devem ser uma opção antes de se prosseguir com a estimulação ovárica, IIU ou FIV, uma vez que os esquemas disponíveis podem exacerbar a dor.

Em utentes com endometriose leve, a estimulação ovárica, com ou sem IIU, aumenta as taxas de fertilidade. Este método é preferível quando a mulher não possui anatomia distorcida, mas são recomendados apenas quatro ciclos, pois cada um pode estimular lesões endometrióticas.

As taxas de sucesso da fertilização in vitro em mulheres com endometriose são semelhantes às com fator tubário, masculino e inexplicável. Ainda não há evidência acerca da afetação das taxas de gravidez na endometriose quando comparada a outras causas de infertilidade, porém a fertilização in vitro é atualmente o tratamento mais eficaz de infertilidade associada à endometriose, especialmente em mulheres com doença avançada.


Artigo originalmente publicado na quarta edição da Revista De Mãe para Mãe, em julho de 2020.

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