Inês Pádua, Nutricionista
A resposta correta é: diferentes! Alergia e intolerância não são a mesma condição, e, muito importante, não têm o mesmo grau de gravidade. A alergia e a intolerância alimentar são reações de hipersensibilidade alimentar - reações que ocorrem em resposta à ingestão de determinado alimento/aditivo.
No caso das reações de alergia alimentar está envolvido o sistema imunológico, o que não acontece no caso de uma intolerância alimentar. Esta é talvez a principal diferença entre alergia e intolerância.
O nosso sistema imunológico é responsável pela defesa contra as doenças e tem como função reconhecer e eliminar agentes patogénicos como os vírus. No caso de uma alergia alimentar, o sistema imunológico reconhece erradamente um alimento como agressor e é desencadeada a reação alérgica.
No caso das reações de intolerância alimentar é muito difícil caracterizarmos o mecanismo envolvido, tendo em conta que podem ser mediadas por diferentes mecanismos, desde enzimáticos, farmacológicos e até psicossomáticos.
Quais são os alimentos envolvidos?
Alergia alimentar
No caso da alergia alimentar, os alimentos responsáveis por cerca de 90% das reações são o leite de vaca, o ovo, o trigo, a soja, o amendoim e os frutos de casca rija (noz, amêndoa, avelã…), o peixe e o marisco. Contudo, poderá existir alergia alimentar a outros alimentos de forma menos prevalente.
Intolerância alimentar
No caso da intolerância alimentar, existe uma grande variedade de alimentos/aditivos associados a queixas e sintomatologia, o que é justificável pelos diferentes mecanismos que podem estar envolvidos. Ainda assim, a intolerância à lactose apresenta uma das maiores prevalências.
Quais são os sintomas da alergia e da intolerância alimentar?
Alergia alimentar
As manifestações clínicas da reação alérgica podem variar de moderadas a graves, podendo ser fatais em alguns casos se não forem convenientemente tratadas. Os sintomas surgem rapidamente (entre alguns minutos até duas horas após a ingestão do alimento) e podem incluir manifestações cutâneas (eczema, urticária), respiratórias (pieira, dificuldade em respirar), gastrointestinais (diarreia e vómitos) e cardiovasculares (diminuição da pressão arterial e perda de consciência). Quando a reação é severa e sistémica (generalizada), estamos perante uma reação anafilática.
Intolerância alimentar
Para muitas intolerâncias alimentares, são reportadas queixas inespecíficas, mas a sintomatologia da intolerância alimentar está geralmente associada a manifestações gastrointestinais (diarreia, dor abdominal).
Alergia alimentar ao leite vs. Intolerância à lactose
Quando nos referimos à alergia ao leite estamos a falar da alergia à proteína do leite de vaca (APLV). Como o próprio nome indica, a parte do alimento responsável pela alergia é uma proteína (assim como em qualquer reação de alergia alimentar). A APLV é uma das alergias mais prevalentes e uma das que mais se associa a manifestações graves e a anafilaxia, principalmente nas crianças.
Na intolerância à lactose, a reação está associada a um hidrato de carbono, tendo em conta que o organismo não consegue fazer a digestão de lactose, que é um açúcar (hidrato de carbono) naturalmente presente no leite. As manifestações da intolerância a lactose são geralmente gastrointestinais (como diarreia e desconforto abdominal), não se associando a qualquer sintomatologia mais grave nem a risco de vida.
Como se diagnostica a alergia alimentar e a intolerância alimentar?
Alergia alimentar
O diagnóstico é feito pelo médico imunoalergologista com base na história clínica do doente e em exames complementares prescritos e realizados em ambiente hospitalar (provas de provocação oral, testes cutâneos por picada e picada/picada, e doseamento de imunoglobulinas (IgE) específicas no sangue).
Intolerância alimentar
Dadas as inúmeras causas de intolerância alimentar que podem existir, é muito difícil indicar um procedimento padrão para o diagnóstico. No caso particular das intolerâncias à lactose e à frutose, por exemplo, este diagnóstico pode passar pelo teste respiratório de hidrogénio. Contudo, para muitas intolerâncias, e dadas as queixas inespecíficas, o processo passa pela exclusão do alimento por tentativa-erro.
Como é tratada a alergia alimentar e a intolerância alimentar?
Apesar de se tratarem de condições diferentes e diferirem em todos os pontos já mencionados, o tratamento da alergia e da intolerância alimentar é semelhante, consistindo na evicção alimentar, ou seja, na eliminação do alimento na dieta, de acordo com orientação clínica. No processo de evicção, o doente deverá ter acompanhamento por parte de um nutricionista de forma a evitar carências nutricionais.
É importante mencionar que o risco de um contacto acidental com o alimento é muito mais grave no caso de uma alergia alimentar, já que pode acarretar risco de vida. Assim, no caso de uma alergia alimentar, a eliminação do alimento da dieta deve ser cumprida rigorosamente, evitando inclusivamente quantidades vestigiais. É necessário ter igual atenção a produtos não alimentares como medicamentos, produtos de higiene e cosmética, materiais para trabalhos manuais, entre outros.
De notar também que, no caso da intolerância à lactose, já existem diferentes opções de alimentos sem lactose no mercado e existem ainda comprimidos de enzimas (neste caso, lactase) que podem ajudar no processo de digestão. Lembre-se, contudo, que os produtos sem lactose não são seguros para quem tem alergia à proteína do leite de vaca!
Artigo originalmente publicado na quarta edição da Revista De Mãe para Mãe, em julho de 2020.
